História

Num dia de 1927, em que a névoa cobria Ouro Preto, mandei um sinal a alguns rapazes estudantes de Engenharia da Escola de Minas que se encontravam em um estado de “não muita lucidez” (in vino veritas, ou, em Ouro Preto, in cachaça veritas). Estes então, tomados pelo espírito iluminista de Gorceix e pelo sussurrar de minhas palavras em suas mentes, erigiram uma morada segura para os “bixos”: a República Arca de Noé. Dentre estes rapazes, o cearence Frederico Albuquerque, ao voltar para sua terra natal, já como ex-aluno Arqueano, deixou registrado no Museu Municipal de Fortaleza, as origens históricas da Escola de Minas e da República Arca de Noé.

O primeiro porto foi na casa histórica do inconfidente Tomás Antônio Gonzaga (atual Secretaria de Cultura e Turismo de Ouro Preto) na Rua Cláudio Manoel. Em meio a turbulências vividas nos idos anos de 30 e 40, grandes Arqueanos como Eitel Burger Frambach, Rodrigo Lopes e Moacir do Amaral Lisboa, tomaram com firmeza o timão da Arca e colocaram-na em rumo certo. Cansados daquelas águas, ou querendo ficar mais próximos dos poucos rabos de saia que circulavam na cidade, flutuaram até a esquina com a Praça Tiradentes, lançando âncora em novo porto. Na realidade o que flutuou foram os móveis carregados nas costas, ladeira acima, pelos rapazes Arqueanos. Um deles, Frambach, exausto, pôs a cama na Praça Tiradentes e dormiu tranquilo até o amanhecer sob a vigilância do sentinela da antiga penitenciária, hoje Museu da Inconfidência. Da Praça a Arca navegou para trás da Escola de Minas, na antiga casa de Moacir Lisboa, tendo como vizinhos a República Castelo dos Nobres e a República Pureza. Dali, após algumas tempestades, os “ventos” levaram a Arca a aportar ao lado da Igreja Nossa Senhora da Conceição (Matriz do Antônio Dias), casa alugada pertencente à João Turco, que na prática nunca recebeu o aluguel.

A Arca continuou acolhendo novos “bixos” e superando tempestades até que num dia de sol e céu azul um homem de gravata e amigo da Escola veio visitar Ouro Preto. Sabendo da visita deste homem, Leonino Ramos Caiado e Kleber Farias Pinto, dentre outros, se prepararam e foram de encontro a ele. O homem era o empresário Antônio Ermírio de Moraes, o patriarca fundador do grupo Votorantin, que admirado com as idéias de progresso colocadas pelos Arqueanos, fez doação à Casa do Estudante da Escola de Minas para construção de duas moradias estudantis, onde uma delas é o atual porto seguro da República Arca de Noé, desde 1958 (Rua Xavier da Veiga, 164 – Centro Histórico de Ouro Preto).
Alegres e orgulhosos com o novo lar, pediram ao amigo artista Chanina uma placa para identificar a República que, não sei por que cargas d’água, foi terminada por um outro artista, um homem de lábio leporino e muito carismático chamado Guinard. E eu pergunto: “ – Onde estará esta placa?”

Desde então a Arca é dirigida por dez rapazes, hoje de diversos cursos da Universidade Federal de Ouro Preto, e que há alguns anos adotam o costume de batizar cada novo Arqueano com um nome de animal. Seus mais de 75 ex-alunos e homenageados têm presença constante na forma dos tradicionais “Quadrinhos de Formatura” e, não menos que eles, a Comadre Maria de Fátima, que cuida de todos com amor há mais de 22 anos.

Esta é a República Arca de Noé, que passa por tempestade e bonança, permanecendo como um lar de convivência harmônica e de profunda amizade, onde respeito, união e fraternidade são fundamentais, fazendo aflorar no coração de cada um o que há de melhor no ser humano.

Ouro Preto, Outubro de 2000
Noé

E assim, em meados de 2007, consagrou-se a reza: